sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Hugo e Sú

Escovou os dentes se olhando no espelho, com certa violência. Muito brava. Claro que estava atrasada, assim como toda segunda-feira. Vestia um pedaço de pano minúsculo que se atrevia a chamar de 'short' e um soutien vermelho surrado, com cheiro de desodorante masculino que agora lhe nauseava de leve.


- Amor, eu juro que botei o despertador pra tocar. -desculpou-se, notando o mau humor da companheira.
Ela permaneceu calada, apenas vestiu o jeans e a regata sem sequer olhar pro lado.
- Não tá dando certo isso de você ficar aqui todo dia, Hugo. Todo fim de semana é a mesma merda.
- Que isso gatinha, vai dizer que você pode ficar sem mim? - era uma tentativa de brincadeira para descontrair que definitivamente não deu certo.
- A única coisa que eu não posso perder é o meu emprego. - disse enfática, com um olhar gelado em direção ao namorado. - E resto é resto, entendeu?

Naquela primeira noite sem Hugo, escutou "Vento no Litoral", de Legião Urbana (sua favorita desde a primeira decepção amorosa), mas não conseguiu chorar. Nem por Hugo nem por ninguém.
Vendo o tempo passar, desligou o notebook, acendeu um cigarro e deixou o telefone tocar a noite toda.
Estavam juntos havia seis meses, e há dois ele passava quase todos os dias dormindo lá, tempo suficiente pra saber que pessoas parecidas demais SEMPRE entram em conflito. Hugo era fisicamente o cara dos sonhos de Sú. E suas bandas favoritas eram as mesmas delas. Também era divertido e inteligente, mas demasiadamente inconsequente, do tipo que muda de emprego o tempo todo e sonha em se casar levando a noiva na garupa da moto pela estrada afora.
Ele era, apesar do visual "marginal", um cara romântico e bonzinho, e realmente apaixonado.
Mas ela já sabia que eles não tinham futuro algum juntos.  E mesmo com suas loucuras a parte, era uma jovem muito ambiciosa e calculista, queria um super futuro pela frente, um ótimo emprego, conta bancária gorda, carreira de sucesso, enfim, era do tipo que não abre mão de suas ambições por relacionamento nenhum. Indiferente ao olhar perplexo do agora ex namorado, cujo começo de namoro foi tão bem marcada por diversão e amor inconsequente, fechou a porta sem sentir remorso. Nem ao menos uma pontinha de dor. Sú conhecia muito bem o prazo de validade de suas relações, e se orgulhava disso. Ao menos era a que NUNCA sofria.
Aquela fora a última noite de Hugo no apê de Sú. E terminar com ele dessa forma não doeu  nada. Ela nem lembrou que ele existia durante todo o dia, até chegar ao prédio e vê-lo chorando à sua espera. O convidou pra subir, tomaram um café, riram um pouco, assistiram "Sexta feira 13" e depois fizeram amor. Após o banho, ela pediu que ele levasse suas roupas e não voltasse mais.
Entrou no box e tomou uma ducha em tempo recorde, enquanto Hugo se vestia apressado e desligava o som que pelo visto tocou Ramones a noite inteira.

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