quinta-feira, 19 de agosto de 2010

7 meses


Em frente a uma estação de metrô qualquer....
-Esse batom vermelho, esse salto alto e essa pose de stripper não me intimida.
 -Não preciso te intimidar, Alex. Aliás,  não sei nem o por quê de termos essa conversa.
 -Tem certeza que não sabe? Quer saber o por quê? Porque eu preciso te desarmar. Preciso te dizer o que ninguém nunca teve coragem de dizer antes. Essa sua mania de pisar nas pessoas tem que parar.
Acariciou com dois dedos o rosto maquiado da jovem, que logo se esquivou, e falou com voz suave e olhar gelado:
-Você é linda, não duvide disso, mas não vale nem o chão que pisa. Beleza acaba. Me diga, e o que sobra depois?

Melissa mudou o olhar de inatingível para surpreso. Parecia um golpe repentino. Sentiu vontade de sair logo dali, mas teve medo de ser  chamada de covarde. O coração disparava como um mau sinal. Engoliu a seco o olhar inquisitor de Alex, enquanto virava para os lados como se procurando uma saída rápida, mas o máximo que conseguiu foi tirar um cigarro da bolsa e acendê-lo para esconder o nervosismo.
-Não sei por que está falando isso. Você não demonstrou nenhuma mágoa quando terminamos.
Deu a primeira baforada em seu Marlboro vermelho, e antes de levá-lo novamente à boca, em uma fração de segundos Alex o arrancou das mãos e jogou fora, pisando-o e alterando a voz:
-AH, eu não demonstrei? Tem certeza disso? Não banque a sonsa! Até o papa sabe o que eu passei! A senhorita não viu nada disso porque a  simplesmente desapareceu do planeta. Sumiu do mapa! Pegou suas coisas do apartamento sem deixar rastro! O apartamento novinho que comprei pra gente, recém-reformado!
-Eu tentei te avisar...
-Como? Com aquele bilhete idiota cheirando a perfume de puta? Eu vou te dizer o que você deixou pra mim, Melissa, você deixou de herança a certeza de que não se pode confiar em ninguém! Você me destruiu, acabou comigo, me fez chorar por todos aqueles sete meses. Sete meses!
Deu uma pausa, tentando controlar a emoção que lhe subia à cabeça, e continou:
-Os primeiros dias foram uma tortura, fiquei enclausurado sem saber o que fazer! Nem seus pais, nem suas amigas sabiam de você. Não teve caráter nem pra se despedir de ninguém. Trocou de número, viajou, sabe-se lá que merda você andava fazendo.. e não me importa mais saber agora. Eu só quero que você saiba que durante todos aqueles dias, eu sofri, me culpei e chorei por sua causa. No início só ficava revendo nossas fotos e pensando 'Meu Deus, por que ela fez isso comigo?'. Emagreci vinte quilos em dois meses, sequei, não comia direito, quase morri. Pedi licença do trabalho, quase fui atropelado várias vezes na rua, cheguei a parar no hospital! Pensei em me matar, e ai meus amigos se afastaram de vez, enquanto minha família pensava em me internar... Tudo parecia ser um sonho ruim! Todos sentiam pena de mim, mas isso não era o que eu queria... mesmo abalado, eu só queria que você voltasse com alguma desculpa que eu te aceitaria de volta.  Não sei como pude ser tão otário...Bem que todo mundo avisou antes que você não prestava, mas eu não dei atenção...
-Para com isso, Alex, você está ótimo... -Mesmo tentando se esquivar da situação, Melissa estava envergonhada e sentia em cada palavra dele uma pontada no coração. Ele ignorou seu comentário e continuou com o mesmo tom:
-Eu não dei atenção... Era completamente louco por você, respirava você, pensava em você o tempo todo. Me sentia o cara mais feliz do mundo quando estava dentro do seu corpo...

Deu uma breve olhada para a ex companheira, que usava um belo vestido preto decotado, mas diferentemente da paixão que existia naqueles olhos há pouco mais de um ano, dessa vez ele lançou um olhar de repulsa. Melissa tentava parecer apressada e impaciente, não queria perder a pose, porém no fundo estava arrasada. Acabara de levar um baque.
Não esperava encontrar com Alex justo na primeira semana de retorno a Brasília. Era azar demais pra uma pessoa só! Fora doloroso recordar o que tentava não pensar mais. Não era sua intenção magoá-lo, tinha respeito por ele, apesar de nunca ter sido realmente apaixonada. Gostava apenas da segurança que ele lhe passara, enquanto todos os outros caras a usavam por puro prazer. Alex fora um namorado sério, comprometido, que em pouco tempo a convenceu a morar com ele. Não era o que ela queria, mas morria de medo de continuar sozinha, vivendo tórridas paixões com homens casados e aventuras inconstantes. Era infeliz morando com Alex, que em sua inocência acreditava no amor dela. Em sua visão, era um amor sem sal, sexo sem prazer, rotina chata. Estava desesperada pra voltar à vida de curtição. Foi daí que tudo aconteceu rapidamente, ela cometera um grave erro em não pensar antes de tomar uma atitude precipitada. Mas seus planos não deram certo. O abandonou devido a uma proposta de emprego em Montevidel, como hostess de uma boate, mas ao chegar lá fora vítima de uma cilada, e fora obrigada a se prostituir. Passou meses vendendo o corpo para pagar a dívida com o cafetão, e após aplicar um golpe nele, conseguiu retornar ao Brasil. Ficou um tempo no Rio de Janeiro ganhando a vida com free lance, até se encorajar a voltar à Brasília, aonde não tinha grandes amigos mas pelo menos a vida era mais fácil, possuia contatos. Procurava não pensar em Alex, o único que um dia lhe dera valor. Esbarrou nele sem querer em frente ao metrô há poucos minutos, e ele, sem acreditar que finalmente encontrara a mulher que despedaçou seu coração em fragmentos pesados, a forçou a esperá-lo falar tudo que estava entalado em si mesmo. Apesar da situação constrangedora e da vergonha em encará-lo novamente, não pode deixar de perceber como ele estava mais bonito, com cara de homem, semblante mais sério. Estava muito bem vestido e carregava uma mala de empresário. Certamente havera sido promovido na empresa, pois transparecia confiança e ar de sucesso.
Após o último comentário que mais parecia uma recaída do que uma briga, Alex se aproximou, tanto que a encostou na parede gelada de mármore e sussurrou:
-Não se preocupe, eu não vou te agarrar. Não venho lhe implorar nada. Eu sinto nojo de você, Melissa. Mas quer saber de uma coisa? Reencontrá-la foi muito bom, eu preciso te agradecer. Obrigado por tudo que me fez passar. Como pode ver, eu estou sim, muito bem. Aprendi com essa porrada que sua ausência me deu. Cresci muito. E aprendi que tudo que um homem de verdade não pode fazer, é se envolver com uma mulherzinha como você.
Alex  ajeitou seu casaco de corte perfeito, deu uma piscada de olho ao melhor estilo cafajeste, e saiu rumo à estação, vitorioso, pegando o primeiro trem que passou para a central do Plano Piloto. Melissa passou os próximos sete meses em depressão, nem um pouco trágica comparada àquela que seu ex sofrera, porém, sem nenhum aprendizado a se tirar. Apenas um porre atrás do outro, com sabor de castigo. A vida mais uma vez mostrou que sabe dar voltas. E como dá!

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